Raivas

Raiva! Algo que esquenta por dentro do corpo. Uma sensação ruim como se um vulcão estivesse prestes a entrar em erupção. O cérebro se afasta por instantes e os olhos não enxergam nada além da tentativa de expulsar aquilo que está incomodando.

Não é fácil prever quando a raiva irá irromperá. Pode ser um inesperado tropeção na beirada da cama, um susto, uma atendente mal-humorada, uma ligação de cobrança errada… inúmeras possibilidades.

Tampouco sabemos o que fazer para impedir que a raiva aflore, já que basta uma fração de segundo para isso acontecer. Da mesma forma, não sabemos como lidar com ela quando já está instalada, muito menos prever suas consequências…

Saber quando e como usar a raiva e, mais ainda, como contê-la, saber distinguir quando ela serve para nos libertar de um sofrimento, quando ela pode nos trazer mais problemas, quando ela condena a alma, quando ela remove ou gera uma injustiça, quando ela pode nos adoecer e, finalmente, quando ela nos cura de um ressentimento, num desabafo… é um quebra-cabeça gigante, cujas peças são tão minúsculas que mal as conseguimos enxergar, quanto mais completar o jogo.

Fato é que a raiva aparece sempre quando estamos diante de uma injustiça. O único problema é que o parece justo para um pode não ser para o outro. Por isso, para facilitar, foram criadas normas, padrões de conduta, leis, regulamentos e, de quebra, psicoterapias para tratar daqueles que, mesmo assim, não conseguem, mas precisam, controlar a raiva.

Todo esse conjunto de normas e leis serve para nortear um caminho aceito pela sociedade como padrão civilizatório e que nos impede de sair por aí soltando a ‘louca’ a qualquer hora, e de qualquer jeito.

Sim, porque há jeitos e jeitos, dependendo da ‘qualidade’ da raiva…

Há a raiva selvagem, despudorada, desbocada, escandalosa, associada a uma neurose em alto grau. Para a psicanálise, nessa raiva histérica (quando não patológica) podem estar contidas inúmeras perdas, angústias e frustrações acumuladas desde o nascimento e que segue vida afora repleta de outros empecilhos nos desviando quase sempre de nossos mais íntimos e puros sonhos e desejos… Enfim, uma sucessão de fatos acumulados até que a tranca da caixa de pandora se rompe e, dali, emerge o caos.

Há a raiva psicopática, vingativa, estratégica, manipuladora e fria, que mente, articula e desfaz o outro de tal forma que este só percebe a raiva quando já está destruído e perdeu todos os amigos.

Há a raiva empática, humanitária, que, ao mesmo tempo em que pode irromper em sua própria defesa, antes pondera o porquê de o outro agir daquele jeito. Analisa as possibilidades de aquela pessoa estar passando por alguma situação de perda ou frustração quanto às expectativas que tinha sobre determinada situação. Procura o diálogo antes da ação que, claro, se não tiver jeito, pode aflorar, mas, normalmente, acaba por se esgotar com o antídoto. Esse tipo de raiva certamente garantirá ao seu portador uma boa posição no time dos bem-aventurados e mansos, com entrada livre no reino dos céus.

Há a raiva psicopática, vingativa, estratégica, manipuladora e fria que mente, articula, desfaz o outro de tal forma que este só se dá conta e percebe a raiva quando já está destruído e perdeu todos os amigos.

Há a raiva empática, humanitária, que ao mesmo tempo que pode irromper em sua própria defesa antes pondera o porquê do outro agir daquele jeito. Analisa as possibilidades de aquela pessoa estar passando por alguma situação de perda ou frustração quanto as expectativas que tinha sobre aquela situação. Procura o diálogo antes da ação que, claro, se não tiver jeito, pode aflorar, mas, normalmente, acaba por se esgotar com o antídoto. Esse tipo de raiva poderá certamente garantir ao seu portador uma boa posição no time dos bem-aventurados-e-mansos com entrada livre no reino dos céus.

Há a raiva orgulhosa que não quer dar o gostinho de o outro saber que algum dia sofreu por sua causa. Soberba, não sublima, apenas se controla, mesmo que esteja corroendo o cérebro que está em guerra entre axônios e dentritos, mas mantém uma postura opaca, nada transparente, só para não demonstrar fraqueza ou dor.

Há a raiva sábia, aquela que mede diâmetro, raio e circunferência e se o tiro servirá para alguma coisa ou será perda de tempo. Faz a conta pela fórmula: custo x benefício, tira a média e, quando age, procura se amparar na lei e nos seus direitos, usando normalmente a justiça como intermediária.

Há a raiva coletiva, que só aparece quando está em companhia, de preferência em grupo, ou seja, ela só irrompe quando alguém risca o fósforo, incita, porque por conta propria passaria em branco. O importante aqui é a algazzara social, fazer barulho, usar rojão e até pneu.

Por fim, há a não-raiva… quando o ser, apesar de respirar, comer, dormir e caminhar, não sente mais pulsão alguma e o sangue parece não mais correr nas veias. Espera a morte como chance de a vida se autoesgotar. Enquanto isto não acontece, ele passa ali, ao lado, inconsciente, escondido, como aquela pelanca que não pode ser engolida em jantar de ricos, amortecida na boca, amargando no tempo.

Mas uma coisa é certa, se a raiva existe,

há uma razão para isso

Prova é que até Cristo a experimentou.

Kawer

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