Sapatos

O que meus sapatos representam no mundo, como eles me representam, ou o que o mundo representa para os meus sapatos?

Provavelmente essas indagações irão automaticamente encontrar teorias e opiniões das mais diversas, principalmente para os aficionados, homens e mulheres, que fazem dos sapatos uma mania pessoal, uma paixão íntima e de especial significado.

Não é de se espantar que justo os sapatos, juntamente com os pés e tornozelos, que ficavam completamente escondidos por debaixo das longas e largas saias das recatadas damas do início do Séc. XIX tomassem um dia um rumo tão diverso ao longo do tempo e de forma especial que até me inspirou a vontade de escrever sobre o tema.

Oriundo do árabe “sabbat”, sapato, comum a todos nós que fazemos uso deles para proteger nossos pés da sujeira do chão que pisamos, em suas mais diversas modalidades: sandálias, sapatilhas, botas, etc., outrora escondidos como símbolo de recato, tomou rumo contrário na ‘modernidade’ de hoje. A partir da primeira grande guerra, em um curto espaço de tempo, quando a praticidade e a falta de dinheiro se tornou uma realidade, os cortes, inclusive no tecido das saias, reduziu o volume e suspendeu o comprimento destas. Daí a sair do esconderijo para se transformar em um objeto de desejo foi um pulo. E por que não dizer, em alguns casos, chegando à beira de uma obsessão. É muito comum vermos cenas tratadas como ‘normalidade’ em filmes em que a classe média e alta demonstram essa espécie de ‘tara’, como o que vi ontem numa comédia, cujo nome não vem ao caso, em que a trama gira em torno de uma separação e uma disputa acirrada pelos bens entre um casal famoso e rico, algo parecido com ‘A Guerra dos Roses (1989)’. Entre os bens disputados e destruídos de ambos os lados, guardaram os mais amados para o final e os sapatos (no caso da personagem feminina) foram os escolhidos para tal.

Devo confessar que não me enquadro nesse universo, e talvez daí minha ignorância para conseguir dar uma resposta de imediato que explique essa simbiose romântica, mas possivelmente ainda é o fator econômico e social que me distancia ainda mais da realidade de quem compartilha esse sentimento tão peculiar. Sendo assim, a pergunta persiste: Por que o sapato? Seguido de perto apenas pela bolsa, o que faz afinal dessas peças do vestuário superarem em desejo às outras, tão encantadoras quanto essas?

Dei uma pesquisada superficial na internet para sondar o que falam sobre o tema e, sem preconceito, li coisas assim: “o sapato passou a ser uma arma de sedução”, “toda mulher tem uma fixação por sapatos”, “não há menina que um dia não coloque os sapatos da mãe e saia desfilando pela casa”, “não há adolescente que não tenha sonhado com seu primeiro sapato de salto alto”, ou “não há mulher que não pare para contemplar (que é muito mais que olhar) uma vitrine de sapatos femininos” e mais ainda: “com um sapato de salto alto a mulher se sente mais poderosa, ativa, dona de si e capaz de enfrentar o mundo”, “a autoestima também ocorre no homem que vendo-a de salto alto passa a enxergar a mulher como ele se vê, pois ela se torna fascinantemente dominadora” e “no fundo, no fundo, o sapato feminino é o maior símbolo de poder de uma mulher!” “Bem, o modelo pode variar, mas a paixão por essas peças é inquestionável.(www.novanoiva.com.br)

De todas essas afirmações, não me encontrei enquadrada como exemplo de nenhuma, e acredito que a autora de tais afirmações quis deixar claro que as mulheres nascem naturalmente com esse ‘fetiche’ em relação aos sapatos. Particularmente achei conclusivo demais para englobar todas as mulheres. Não me lembro de calçar os sapatos da minha mãe, só me lembro de ter vestido uma vez sua camisola. Também não me lembro de, quando era mocinha, sonhar com meu primeiro par de sapatos e, por fim, para ser mais detalhista, acrescento que minha fixação estética estava bem mais ao alto, nos cabelos. Os tinha crespos, encaracolados, mas gostava dos lisos, chapados. Não havia pranchas na época, nem escovas inteligentes, o negócio era na touca de meia calça e só.

Fui procurar em outro site uma explicação mais aprofundada, talvez que buscasse o ‘psicológico’ da questão e encontrei um anunciando uma explicação científica para explicar a fixação nos sapatos: “A compra de sapatos produz um efeito antidepressivo sobre as mulheres e faz com que a ansiedade seja eliminada”; “A experiência é mais agradável, se a compra envolver objetos como sapatos e bolsas, já que, mesmo que emagreçam ou ganhem peso, os sapatos sempre ficarão bem para elas. É uma maneira de melhorar a autoestima, dando uma sensação de bem-estar (www.incrivel.club)

Então, pensei, este ponto de vista vai de encontro ao do primeiro site sobre a questão da autoestima…

No terceiro encontrei algo mais eclético e bem humorado, de alguém quem foi pago para escrever qualquer coisa sobre o assunto e escreveu o óbvio e se safou: “pessoas extrovertidas preferem sapatos mais chamativos”, “sapatos caros indicam que o salário tá ótimo”, “usar botas é sinal de agressividade (coturno, então, nem se fala…)….”, “Ah, e tem mais, usar sapatos confortáveis mostram que você é uma pessoa calma. Já o salto alto indica nervosismo”.(www.super.abril.com,br)…. gosto de sapatos confortáveis, com saltos normais, mas acrescentaria uma visão de reciprocidade ao fato estudado: pois acho que as pessoas calmas o são justamente por usarem sapatos confortáveis.

Apurei entre um e outro site as impressões para tirar alguma conclusão e não deixar o texto inacabado e aqui estão, apressadamente, para não ser enfadonho, minhas conclusões:

  • Ansiedade causa compulsão e, para quem tem dinheiro sobrando, ou algum desequilíbrio, gera sede de comprar, consumir, gastar… e quanto a ser especialmente sapatos é a certeza de que estará comprando uma peça que fará com que a atenção das pessoas se volte para um ponto distante de algo que ela prefere esconder.
  • Quando essa compulsão está aliada a um determinado círculo e padrão social, torna-se uma imposição comportamental, algo como um regulamento obrigatório para entrar;
  • O fato de usar sapatos altos pode ser puramente um fator estético, para alongar o corpo, por exemplo, o que não deixa de ser uma certa falta de segurança.
  • Quando falo em sapatos altos, tenho em mente, aqueles saltos agulha, cujas medidas são as que ultrapassam os sete centímetros, pois os outros até eu uso, e continuo calma.
  • A questão dos homens verem em suas mulheres poder e dominação empoleiradas em saltos altos, eu, humildemente, questiono, e digo que é justo o contrário, acho que é pura vaidade mesmo, acho até que um certo desejo de submissão, pois não há nada para mim tão incômodo quanto andar com o pé em posição de escorrega. Além disso eu mesma Já ouvi homens dizerem às suas parceiras que não sairiam com elas se estas passassem a usar saltos baixos. Se isso é liberdade e poder feminino…
  • Por último, vem a idade e tudo isso vai, vaidade, desejos, vão para o mesmo sítio.
  • Os ortopedistas é que agradecem no final, pois a consequência de tal capricho, são inúmeras clientes com problemas nos pés, nos joelhos e na coluna. Por isso, sinceramente, para mim, não vejo muita diferença entre os sapatos altos e o uso daqueles espartilhos que espremiam os pulmões para fazer a cintura fina*… Um costume que um dia acharemos absurdo, na minha opinião.

http://g1.globo.com/bahia/jornal-da-manha/videos/v/ortopedista-fala-sobre-os-perigos-do-uso-dos-sapatos-de-salto-alto/3036037/

*O espartilho era acusado de causar dezenas de doenças, de câncer à curvatura da espinha, deformidade das costelas e dos deslocamentos dos órgãos internos, doenças respiratórias e circulatórias, doenças congênitas, abortos, traumas, costelas quebradas e feridas. (Era Vitoriana WordPress.com)

Mulher com corpete em 1900 (Era Vitoriana WordPress.com)

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