Para mim, que não sou pagodeira, nem sertaneja, não curto funk, nem música evangélica, salvo raras exceções tais como Zeca Pagodinho, Almir Sater, Claudinho & Bochecha, respectivamente, faltava um exemplo para o último gênero, e eis que tive como o eleger nesta manhã…
Fato é que eu estava na academia e resolvi experimentar a aula de dança.
Para lá de simpática, a professora, da mesma faixa etária da turma, corpo exemplar, chegou transbordando animação, daquela intensidade que às vezes acho meio forçada, mas que logo reconheci ser fruto da sua jovialidade, carinho e gosto pelo ofício. Logo que entrou, deu por uma cara nova e me cumprimentou.
A turma já estava formada, e isso quer dizer que já haviam ensaiado a coreografia sabe-se lá quantas vezes. Me instalei no meio da sala (tenho que entender essa necessidade psicológica), quero acreditar que seja para ver melhor a professora e seguir os passos certos, mas, sensata, fiquei na terceira fila, para não atrapalhar.
A professora atravessa a sala para colocar a música. Preciso dizer que era uma aula de ritmos mistos, e calculei, pela faixa etária, ser dos anos vividos pela nossa geração e que amamos dançar nos flashbacks da vida.
Mas, eis que, em alto e bom tom, entra outro som…. “hoje eu acordei com pé direito e resolvi agradecer por cada feito…. “ e já começa a coreografia a funcionar, primeiro lentamente, com gestos calmos, passinho à frente, para o lado, um pagode com letra respirando à música evangélica. Nada contra, mas…
Como escapar?! Via a professora pelo espelho que, certamente, me via também. Só pude rir de mim mesma…
Apelei para o senso de adaptação de quem já foi emigrante. A coreografia era simples, minha coordenação motora estava até bem boa, para quem não dançava há um bom tempo. Portanto, nada a temer, só o espelho, que ocupava toda a parede em frente e não deixava nada escapar, dava para avaliar o grupo assim como a performance individual e, com o agravante que isso é coisa que mulher faz melhor que ninguém.
Passinhos à frente, ao lado, jogada de cintura, e as mãos se uniam quando a música falava ‘fé’, e quando chegava a hora certa, tudo se estancava, inclusive os braços, para focar nos pés, a dois por dois, sambinha de raiz coordenado com os quadris, que, seguramente, era o mais difícil de fazer, para depois voltar tudo ‘da capo’: andanças para frente, para trás, ao lado e vira e dá uma sambada e ergue as mãos para o alto e desliza as mesmas pelo corpo, dessa vez enaltecendo, não a Deus, mas à própria libido.
Se a neurótica de Freud estivesse ali presente talvez dissesse ao pai da psicanálise que aquela dancinha lhe fizera um bem maior que a ‘limpeza de chaminé’ que ele usava na associação livre através da sua fala. É algo mais simples, pois, nela, a mente não se dá ao trabalho sequer de conectar palavras, formar pensamentos. É só corpo e música, instantâneo, sem ter que revelar nada, só libertando a si mesmo.
Portanto, àquela hora da manhã, naquela sala, havia as que cantavam em simultâneo à dança, havia as tímidas que se contentavam em fazer parte daquilo, escondidas lá atrás, e eu, no meio termo, havia também as que, sem sair da coreografia, alargavam os movimentos e aproveitavam para pular numa grande euforia, soltando os braços e as pernas com movimentos libertadores, eu diria. Havia também as que acrescentavam mais beleza à música e não paravam de se olhar, maquiadas, no espelho, e havia, no geral, uma alegria contagiante.
… mas não fugindo ao propósito do post, a musica eleita, foi esta, em específico, que antes eu não ouvirira, mas que, naquele instante, me arrepiou dos pés à cabeça, pois me pegou desprevenida.
E assim, aprendi, àquela hora da manhã, que Tiaguinho, o cantor, acertou em cheio em ter escolhido esta música para gravar e eu percebi que a música, sem prevenção e preconceito, pode trazer qualidade em qualquer gênero, pois o que vale é o recado e o momento. E t’aí, reconheço, eu precisava ouvir esta, naquele momento…
Hoje eu acordei com o pé direito
E resolvi agradecer por cada feito
Olha onde eu ‘to, Deus é perfeito
Eu tive medo, mas eu fui com medo mesmo
Um dia eu sonhei com tudo isso aqui
Se não aconteceu ainda ‘tá por vir
‘To na minha ‘vibe’, numa boa, eu sei que vou chegar
O que é meu ninguém pode tirar
É
Eu vou seguindo de cabeça em pé
Eu perco tudo, mas não perco a fé
Eu ‘to em busca da minha sorte
Eu ‘to no corre
Sabe como é…
Eu vou seguindo de cabeça em pé
Eu perco tudo, mas não perco a fé
Eu ‘to em busca da minha sorte
Eu ‘to no corre (Billy SP)
Não desista antes de acontecer
Tem alguém que se inspira em você
E por mais que a noite pareça escura, ‘tá perto de amanhecer
Não desista antes de acontecer (jamais)
Tem alguém que se inspira em você (em você demais)
E por mais que a noite pareça escura, ‘tá perto de amanhecer (palma da mão)
Hoje eu acordei com o pé direito
(Seja forte e corajoso, levanta e anda, vai em busca da sua sorte)
(É sobre não desistir)
Kawer
Amei